Quando pensamos em Diagnóstico, logo nos vem à mente um conjunto de sinais e sintomas que vão caracterizar uma determinada condição. O diagnóstico de um problema cardíaco, por exemplo, acontece por meio da investigação clínica, exames de laboratório e de imagens, em que, ao analisar cada um desses dados, chega à conclusão da existência ou não de uma alteração no coração.
No Autismo não é diferente, há de se realizar uma boa “investigação” de sinais e sintomas, para que se possa fechar o Diagnóstico. Mas, nesse caso, há uma diferença importante. No TEA, não existem exames de laboratórios ou de imagens que nos digam se aquele indivíduo é ou não autista.
Então como é feito o Diagnóstico?! Esse diagnóstico é feito por meio da investigação clínica de sinais e sintomas. Durante muitos anos, pesquisadores da área foram catalogando quais eram as características que mais apareciam nos Transtornos do Espectro Autista e conseguiram organizar tudo em um “manual”.
Nesse manual também estão sinais e sintomas de outros transtornos mentais e é frequentemente utilizado por profissionais da área da saúde, que buscam, após suas avaliações, enquadrar ou não, seu paciente em um desses transtornos.
Você sabe como é conhecido esse Manual?!
DSM – 5 – Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5ª edição ou DSM-5 é um manual diagnóstico e estatístico feito pela Associação Americana de Psiquiatria para definir como é feito o diagnóstico de transtornos mentais. Foi elaborado em 1952, embasado em pesquisas, esse manual é atualizado a cada 10 – 15 anos (DSM-5, 2014)
Além desse Manual, temos também a CID (Classificação Internacional de Doenças), que está em sua 10ª edição (a 11ª edição já foi apresentada para adoção dos Estados Membros em maio de 2019 e entrará em vigor em 1º de janeiro de 2022). Este importante manual/sistema de classificação não analisa apenas transtornos mentais, mas também o conjunto de todas as doenças, distúrbios e alterações existentes.
É importante saber que, até a 10ª versão da CID, havia diferenças consideráveis nas nomenclaturas utilizadas quando se tratava de Autismo.
Atualmente, consideramos a díade “déficit na comunicação social” e “comportamentos restritos e repetitivos” como situações base para o diagnóstico de TEA. Realizar um diagnóstico de qualidade requer habilidade dos profissionais envolvidos, uma vez que a conclusão do transtorno é realizada a partir de aspectos clínicos observados. Na Figura 2.1, apresentamos alguns aspetos que requerem atenção para que haja uma conclusão assertiva quanto ao TEA:
A seguir, apresentaremos, de maneira mais detalhada, tais condições (DSM-5, 2014):
a) Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, conforme manifestado pelo que segue, atualmente, ou por história prévia; Déficits na reciprocidade socioemocional, Déficits nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação social, Déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos.
b) Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, conforme manifestado por, pelo menos, dois dos seguintes, atualmente ou por história prévia (movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos, insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal, interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco, hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente.
Quando falamos sobre PADRÕES RESTRITOS E REPETITIVOS DE COMPORTAMENTO, estamos nos referindo àquelas pessoas que, na escola, por exemplo, preferem sempre a mesma atividade (massinha, pintura, quebra-cabeça, alfabeto, folhear livros) e quando são convidadas a mudar de atividade, se mostram excessivamente irritadas (choros excessivos podem acontecer). Também podem gostar de organizar brinquedos/objetos de uma maneira específica ou fazer um movimento com o corpo por repetidas vezes e sem uma função específica.
c) Os sintomas devem estar presentes precocemente no período do desenvolvimento, mas podem não se tornar plenamente manifestos até que as demandas sociais excedam as capacidades limitadas, ou podem ser mascarados por estratégias aprendidas mais tarde na vida.
Em relação aos SINTOMAS, o que podemos presenciar em alguns casos são pessoas que são caracterizadas como tímidas, introvertidas, com dificuldades em se encaixar socialmente, mas que na verdade, possam ter TEA. O contexto onde a criança se desenvolve pode facilitar ou mascarar um diagnóstico precoce. Atualmente, muitos adultos têm descoberto que toda a dificuldade que sentiam em se relacionar com as pessoas, na verdade era sintoma do transtorno do espectro autista não identificado.
d) Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente.
e) Essas perturbações não são mais bem explicadas por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento. Deficiência intelectual ou transtorno do espectro autista costumam ser comórbidos; para fazer o diagnóstico da comorbidade de transtorno do espectro autista e deficiência intelectual, a comunicação social deve estar abaixo do esperado para o nível geral do desenvolvimento.
Quando falamos sobre COMUNICAÇÃO SOCIAL ABAIXO DO ESPERADO, estamos falando daquelas crianças que, apesar de falarem várias palavras e até fazer pedidos de itens que desejam, não são capazes de narrar um fato que ocorreu, iniciar/manter um diálogo ou mesmo responder perguntas.
Além das situações base apresentadas, o diagnóstico do TEA também deve considerar o grau de severidade; assim, são definidos especificadores da gravidade dos sintomas, com o intuito de garantir um melhor acompanhamento das necessidades relacionadas à comunicação social e aos comportamentos repetitivos e restritos, de maneira distinta.
Ainda é importante destacar que a gravidade desses sintomas poderá variar conforme o contexto ou oscilar com o tempo. A seguir, na Tabela 2.2, são apresentados os níveis de severidade do TEA. Analise:
Fonte: Fga. Me. Camilla Guarnieri e Profª Drª Simone Herrera (material parte do Curso de Atualização “Intervenção Fonoaudiológica em Linguagem Infantil”, USP, 2017).
Quantas informações sobre o TEA não é mesmo?
Perceba que, ao longo dos anos, os pesquisadores foram catalogando vários sinais e sintomas e, atualmente, o diagnóstico tem se tornado cada vez mais possível e muito mais precoce do que antes.
O Diagnóstico do TEA é clínico, ou seja, não há exames laboratoriais que detectem se há ou não o transtorno naquele indivíduo. Assim, para se chegar a uma conclusão, é preciso um olhar atento dos profissionais, informações valiosas fornecidas por familiares e dos educadores, além de instrumentos de avaliação e de rastreio.
Assim, por ser clínico, o diagnóstico deve ser pensado na perspectiva das diferentes habilidades de comunicação e interação da criança. Por vezes, vemos crianças não sendo diagnosticadas precocemente, pois o atraso na fala não é visto como fator de risco. Em outros casos, chega-se a supor que a criança tenha uma dificuldade auditiva e por isso, não atende ao chamado dos pais. Ainda, vemos crianças que são caracterizadas como de personalidade difícil e birrentas.
Conhecer as características do TEA, dirigir um olhar atento à criança, considerar os traços de autismo que possam estar presentes e, principalmente, a intensidade desses traços, pode ser determinante neste processo.
Mas você precisa ir além! E dar o próximo passo aqui é conhecer os instrumentos de rastreio que existem atualmente e que auxiliam na identificação de sinais e sintomas do TEA.
Os instrumentos para rastreamento têm por finalidade identificar os sinais precoces de risco do autismo, e não de diagnosticar o transtorno (IBAÑEZ et al., 2014). Geralmente, são utilizados quando a criança ainda é pequena e suas características de comunicação social ainda não se enquadram totalmente nos sinais e sintomas descritos no DSM-5.
Agora, vamos conhecer alguns dos principais instrumentos que permitem identificar os sinais e sintomas do Autismo:
VB-MAPP (Verbal Behavior Milestones Assessment and Placement Program) (SUNDBERG, 2007-2015; 2014): é um instrumento de avaliação e acompanhamento do desenvolvimento de repertórios para crianças com autismo e outros distúrbios do desenvolvimento. Contém cinco componentes:
A partir dessa escala é possível distinguir entre o autismo e outros atrasos no desenvolvimento. A sua importância é baseada na capacidade de diferenciar o grau de comprometimento do autismo entre leve, moderado e severo. Sua aplicação é rápida e adequada a qualquer criança com mais de 2 anos de idade (SCHOPLER, REICHLER, RENNER, 1988).
Escala Bayley (ou Escala de Desenvolvimento Infantil de Bayley) (BAYLEY, 2018): um instrumento administrado individualmente, que avalia o funcionamento do desenvolvimento de bebês e crianças pequenas, de 1 a 42 meses de idade. Consiste em identificar atrasos no desenvolvimento e auxiliar no planejamento de intervenções, por meio da avaliação de 5 domínios: cognitivo, linguístico, motor, socioemocional, comportamento adaptativo. Este teste não é de livre acesso, sendo necessário adquirir o material impresso para ser utilizado.
IPO (Inventário Portage Operacionalizado) (WILLIAMS; AIELLO, 2001): é composto por 580 comportamentos distribuídos em cinco áreas, separados por faixa etária de zero a seis anos e uma área específica para bebês de zero a quatro meses. No inventário são avaliadas as áreas de cognição, socialização, autocuidado, linguagem e desenvolvimento motor. Este instrumento de rastreio está disponível nos materiais complementares.